La pratería, da série La servidumbre (c. 1978-1980), Sandra Eleta

La pratería, da série La servidumbre (c. 1978-1980), Sandra Eleta

Alguns personagens de nosso cotidiano são tratados como invisíveis, seja em nossa sociedade ou na esfera do lar. A roupa passada, o almoço servido, o banheiro limpo, nada acontece simplesmente, são frutos de um labor diário de homens e mulheres que abdicam de seu tempo com sua própria família para cuidar das casas de outros. Estão sempre presentes, realizando os afazeres, mas, muitos empregadores, não os querem visíveis em sua casa. O trabalho é feito em silêncio, a troca de um cômodo para outro é feita sem barulho. É quase como não existir, mas sempre deixar presentes fatos que comprovem sua passagem. 

A fotógrafa Sandra Eleta retrata temas que fazem parte de seu cotidiano. Durante alguns anos ela fotografou empregadas domésticas e mordomos para a série La servidumbre. Colocando esses personagens em uma posição de protagonismo ativo, Eleta busca retratar as mudanças que o trabalho sofreu e como esses personagens possuem mais agência sobre seus fazeres. Em entrevista para El País, a artista comenta como os sujeitos que retratou se impõe mais em seus trabalhos do que empregados que ela conhecia de uma geração mais antiga, que seguiam desaparecendo no fundo da casa. Em seus retratos, Sandra deixa a escolha do cenário livre para o sujeito retratado. Dentre as funções de seu trabalho, qual imagem querem criar?

Na fotografia La platería, vemos duas mulheres limpando talheres, bandejas e objetos de prata de uma casa. Duas mulheres de gerações diferentes, duas mulheres que possuem histórias e relações com seu trabalho diferentes. Na imagem, elas se colocam de maneira singular, a mulher mais velha, sentada em uma cadeira, nem levanta sua cabeça na hora do registro, seu olhar segue direcionado para seu trabalho, suas mãos se ocupam com uma bandeja e o pano que usa para limpá-la. Nada parece tirar sua atenção da tarefa a realizar. A outra mulher está sentada no chão, segura uma escultura de um veado, ele parece quase um animal de estimação, da forma como ela o envolve com suas mãos e o deixa repousar em seu colo. Seu penteado não é o mais arrumado, suas unhas estão com o esmalte descascando, ela não parece ligar – ou se importar caso sua “patroa” reclame – com uma limpeza cirúrgica de sua imagem, apesar de usarem uniformes, esses pequenos detalhes a tiram da padronização e a destacam, fortalecem sua identidade dentro do trabalho e do cotidiano da casa na qual trabalha. Diferente de sua companheira de trabalho, seu olhar não está direcionado para a função da limpeza dos objetos, ela olha para a câmera, seus olhos encontram os nossos, ela se apresenta, se faz presente na imagem e enfrenta olhares que são direcionados à ela. Ela está aqui, ela está presente. 

Sandra revela não apenas o ofício, mas também a diferença entre gerações, como cada mulher se vê no trabalho exercido e como desejam ter sua imagem divulgada. Através do registro da arrumação e limpeza da prataria de uma casa, a artista apresenta relações de classe, desejos, medos e ressignificações do trabalho doméstico. 

Colírio por Julia Baker



Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *