Aquí, aún hay un corazón que late (2016), Luna Flores

Aquí, aún hay un corazón que late (2016), Luna Flores

A performance começa com um corpo ensacado. Completamente coberto, dentro de um saco de lixo grande, aqueles de muitos volumes que compramos quando estamos passando por obras ou que aparecem nas lixeiras compartilhadas dos prédios. São os mesmos sacos usados, em momentos emergenciais, para cobrir corpos assassinados enquanto a ambulância não chega para levar o corpo para o necrotério. O saco está fechado, disposto em uma rua com passantes por todos os lados. Aos poucos Luna se mexe, seu corpo se revela dentro do saco, por hora seus pés e pernas se tornam visíveis, em outros momentos são suas mãos. Independente de qual parte do corpo escapa do saco, algo é notório, ela quer sair, respirar, se libertar. Aos poucos ela consegue se libertar e começa a interagir com as mulheres que assistiam a performance. Luna entrega pétalas de rosas vermelhas a cada espectadora. 

A performance é feita em tom de denúncia. Quantos corpos femininos já foram ensacados? Quantos corpos femininos foram mortos e desapareceram? Quantos corpos femininos ainda são multilados diariamente? A artista tem como intenção tocar no tema do feminicídio. Em países latinos, em que o machismo estrutural se faz presente diariamente, o assassinato de mulheres por pessoas conhecidas e desconhecidas não é incomum. Muitas vezes acompanhado por outros tipos de violência contra aquele corpo, mães, filhas, irmãs e avós encontram um triste destino: a morte. Uma morte que dilacera a família, que coloca medo em outras mulheres e nos impede de andar nas ruas de noite, sair sozinhas e vários outros comportamentos que fazem parte do convívio em sociedade. 

O coração ainda bate. O título da obra nos faz pensar. Quantos momentos um último suspiro, uma última batida do coração esteve presente amarrada em um saco de lixo? Ou, ainda, mesmo quando o encontro com a morte não ocorre, após socos e pontapés, o coração se mantém vivo, após inúmeras violências sofridas.

A artista disponibiliza seu corpo, se coloca vulnerável nas ruas para criar choque e despertar a consciência sobre o feminicídio. Ela escapa do espaço constrito, seu coração ainda bate. Mas quantas não tiveram tal possibilidade?

Colírio por Julia Baker



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