O Atlante

O Atlante

De 12/01 a 02/02

Local: Alinalice, n 1022, Bairro das Laranjeiras

Coletiva Curatorial:  Napupila

Realização: Alinalice

O Atlante: quando o ser torna-se mar

Muitos acreditam na existência de um certo continente chamado Atlântida que teria sido uma grande potência naval nos anos 9.600 a.C. A crença é reforçada por Platão em seus textos Timeu e Crítias, onde descreve o continente e seu povo, os atlantes. Segundo o autor, os atlantes eram um povo com muitos conhecimentos marítimos e tecnológicos, o que garantia uma supremacia sobre os demais povos e os permitia invadir e colonizar
outras terras. Atlântida, segundo Platão, foi destinada a Poseidon – deus dos mares – e cabia a ele organizar como a ilha seria dominada. Rodeada de água, sob a regência do encantador de onda, Atlântida recebia fluxos de pessoas diferentes e a ligação de seu povo era intensa. Tanto que, seu destino final foi ser engolida pela água. As lendas contam que ainda hoje é possível encontrar o continente inteiro submerso no mar, em alguma região no oceano Atlântico. Fato ou invenção, Atlântida e seu povo habitam o imaginário popular e funcionam como analogia para estudiosos e escritores.

Beatriz do Nascimento, na antropofagia filosófica da resistência negra, comenta a dura saga dos escravizados africanos como povo atlante, habitantes do oceano. Assim como a água, ela atlânticafortalece sua cultura a partir dos encontros, da comunicação, dos movimentos migratórios, e da potência de dos rituais que herda. Ela evocam o fluxo como motivação de uma sobrevida, que não reconstitui o que foi deixado à margem, mas que resiste ao “tornar-se”.

No contexto contemporâneo, de acordo com a ONU, existem 783 milhões de pessoas no mundo que vivem sem água potável. Em 2025 esse número pode chegar a 1,8 bilhão. No Brasil, essa realidade toma de assalto os grandes centros, mesmo sendo esse o país que abriga o maior aquífero do mundo, o Guarani.

A água está em 2/3 do planeta e mais da metade desse percentual é utilizado para a nossa subsistência. Fluxos que atravessam a nossa constituição física, como a lágrima, o suor, a saliva, a placenta e a urina, e que inevitavelmente ganham conotações simbólicas, afinal somos água – um adulto possui até 65% de água em sua composição corpórea, o que em um recém-nascido chega a 78%.

Deixar de ser gota para tornar-se oceano é uma metáfora sobre o movimento de renovação que se prolonga entre a vida e a morte. A água é o elemento que materializa esse ciclo. Incolor e inodora, ela alimenta a vida e purifica os acúmulos deixados pela existência. Simboliza a gênese, a impermanência e a calamidade. Nas abluções islâmicas, no batismo cristão, nos mikved judaicos, nos rituais funerais do hinduísmo, na alquimia antiga, a água aparece como matéria que restitui os seres e as coisas ao seu estado de pureza.

Hidras, sereias, ninfas, e leviatã foram evocados pela literatura das águas, presente nos mapas de navegação, na oralidade anciã e na história das descobertas colonialistas.

Neste sentido, partindo das diferentes experiências de um conjunto de seis artistas, O Atlante: quando o ser torna-se mar, vêm dialogar com nuances diversas e algumas das variadas representações que o ser Atlante pode vir a ter.

Em um cenário tropical, Maria Sabato, se lança à sorte em um mergulho na caixa d’água. Sendo a palavra água um substantivo feminino e ligado à ideia de sagrado, o rito de libertação que esse banho orienta nos diz sobre a autonomia dos corpos e satisfação de desejos.

A partir de uma chancela laboratorial, André Anastácio apresenta o resultado da coleta, produzida em diferentes partes da cidade, de sons e vibrações da água, os quais representam suas várias densidades e particularidades, em uma síntese relacional com a
vida.

Alexandre Vogler assume a postura de um caiçara que, ao navegar pela Baía em uma canoa, documenta, ao mesmo tempo em que critica, o desajustado modelo político e social do planejamento urbano da cidade do Rio de Janeiro.

Através das ondas de seu livro objeto, Gabriela Noujaim afirma a possibilidade de fortalecimento das pontes afetivas entre grupos marginalizados, mesmo aquelas criadas em momentos limítrofes da humanidade, como no período do Apartheid -regime de segregação racial; onde a população da África do Sul teve seus direitos suprimidos por uma minoria branca dominante.

Em suas ações performáticas o grupo de artistas do Coletivo Liquida Ação se apropria da água para comentar e questionar certezas políticas e sistemas econômicos. Através de seu repertório referencial produz intervenções que venham a derrubar verdades institucionais.

A infinitude e repetição do mar se apresentam no trabalho de Bob N. Na obra o artista consegue capturar as possibilidades que o oceano nos oferece que, mesmo parecendo múltiplas são repetições de ações sem fim.


Água é matéria, matéria prima da vida, permite encontros e desencontros, fluxos migratórios, trocas monetárias e sociais, principalmente em cidades como o Rio de Janeiro, onde a praia se torna personagem principal do verão.Pensando em todas as possibilidades poéticas, sociais, políticas e estéticas que a água pode nos trazer, reunimos aqui trabalhos cujo a força motriz é a água.

Curadoria
NaPupila – Ana Lobo, Julia Baker e Michaela Blanc

Fotos: Rizza

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Artistas

Liquida Ação: Coletivo Liquida Ação: O Coletivo Líquida Ação, formado em 2006, realiza performances com artistas de diversas áreas. Em suas ações/intervenções, o uso da água como bem comum e elemento vital desloca fronteiras sociais, políticas e culturais das cidades promovendo uma liquidação da arte em lugares públicos.Corpo/água/espaço são dispositivos de montagem de ações líquidas que absorvem o espaço vivido e subvertem as medidas do tempo utilitário. Explorada como elemento transitório, diluidor e purificador, a água materializa diversas temporalidades da performance nesta pesquisa artística em torno de uma estética da alteridade.O Coletivo é entendido como espaço político que coloca em risco as certezas sólidas, desafia nossas diferenças pelo dissenso, e pulsa necessidades vitais em direção ao comum. https://www.coletivoliquidaacao.com/
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Alexandre Vogler: Artista Plástico, Doutorando em Linguagens Visuais pelo Programa de Pós-Graduação da Escola de Belas Artes – UFRJ. Professor do Instituto de Artes da UERJ. Desenvolve desde 2000 trabalhos em contexto público e sistemas de comunicação tais como Atrocidades Maravilhosas, Fumacê do Descarrego, Olho Grande, Tridente de Nova Iguaçu e Retrofit. Realizador do curta-metragem Base para Unhas Fracas, 35mm, 2011 e co-Diretor da peça teatral Aplique de Carne (2013). Realiza as individuais: Base / Tridente NI, Centro Cultural São Paulo, 2009; Abre Caminho e O Condomínio na Galeria A Gentil Carioca , 2007 e 2005 respectivamente e Pintura de Fresnel no Paço Imperial, RJ, 2018.http://www.alexandrevogler.com.br/

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André Anastácio: Artista Plástico e pesquisador (PPGAV-EBA), desenvolve sua prática nas áreas de tecnologias híbridas, circuit bending, arte sonora, sonificação, dispositivos interativos, e mediação sociopolítica. Colaborador do laboratório NANO em plásticas sonoras híbridas, integrou os coletivos Uoco(Arte sonora), Biônicos (experimentação digital), Zebra(Arte Urbana). Expôs trabalhos em diversos espaços como: Casa Rio, Casa Comum, CMAHO, Festival de Cultura Digital, Casa França Brasil, Museu do Amanhã, entre outros. Seu processo de criação costuma fazer uso da tecnologia aplicada a determinados contextos, para provocar reflexões  do “imbricar das dinâmicas e relações sociais” com o meio habitado. https://4n4st4cio.wordpress.com/portfolio/ritos/

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Gabriela Noujaim é gravadora, vídeomaker e professora. Em 2011, recebeu a Menção Honrosa, no festival de vídeo arte “Lumen EX”, em Badajoz, Espanha. Foi Prêmio Aquisição no 39o Salão de Arte Contemporânea de Santo André, SP, e realizou uma exposição itinerante “Luz e sombra”, no Centro Cultural Banco do Nordeste, em Sousa, PB e Juazeiro do Norte, CE.

Participou de diversas exposições coletivas entre elas: “Black Tie” no Centro Cultural BNDES, RJ, em 2011, “Entre imagens” na Galeria Largo das Artes, RJ, em 2007, “Extra- Muros”, no Paço Imperial, RJ, em 2005 e “Posição 2004” na EAV do Parque Lage, RJ, em 2004. Possui obras em acervos dentro e fora do Brasil.} https://gabinoujaim.blogspot.com/

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María Sabato, 1984, Ciudad de Buenos Aires

Fotógrafa profissional pela Escola de Fotografia Criativa de Andy Goldstein, Buenos Aires, Argentina. Em 2015 recebeu uma bolsa da Escola de Artes Visuais do Parque Lage para cursar o Programa anual Práticas Artísticas Contemporâneas II, dirigido por Lisette Lagnado. Tem participado em exposições coletivas e realizado projetos individuais em cidades como Buenos Aires, Rio de Janeiro e Tokyo. Também realizou residências artísticas em espaços como FAAP (SP, 2016) e Despina (RJ, 2014)

Em 2018, já na cidade de Buenos Aires fez o Programa de CIA (Centro de Investigaciones Artísticas) dirigido por Roberto Jacoby, e fez residência nos ateliês MARCO Arte Foco.

Atualmente está cursando,em Madrid, mestrado em prática cênica e cultura visual, no Museu Centro de Arte Reina Sofia.

O curso da investigação/pesquisa prática de Maria vem sido guiado pelos deslocamentos físicos e simbólicos inerentes à condição de mulher estrangeira. A sua pesquisa apresenta-se em forma de fotografias, vídeos, instalações e ações participativas em diferentes espaços público-estéticos, nos quais o seu corpo costuma ser o principal suporte e objeto de trabalho.

Através de diferentes práticas do campo da arte, pesquisa e problematiza sobre a sua trajetória nômade, a relacionalidade intercultural, o consumo, a mídia de massa, a desterritorialização e a possibilidade de sociabilizar ou criar comunidades efêmeras aleatoriamente a partir de uma ação determinada.

Nos últimos tempos, tem concentrado suas intervenções na relação existente entre a circulação de objetos de consumo comestíveis e o corpo da mulher, com a finalidade de refletir e questionar, entre outras coisas, os critérios de identificação feminina esperados pelas distintas sociedades. https://cargocollective.com/mariasabato

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Bob N

Bob N é artista plástico. Nasceu em 1967, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha.Estudou com Ivan Serpa, Orlando Mollica, João Magalhães, Anna Bella Geiger, além de outros tantos mestres.

Participou da Bienal de São Paulo SP; Bienal de Liverpool; Contemplation Room Overgaden Gallery – Copenhagen, Dinamarca; Bienal VentoSul, MAC – Curitiba, PR; Um Século de Arte Coleção Gilberto Chateaubriand, MAM – RJ; Pindorama Lounge, Pinacoteca – SP; Individual MAM-RJ; Visões do Paraíso, MAC – Niterói; Fuit Hic, individual Museu da República – Rio de Janeiro, RJ; Salão da Bahia, MAM – BA; Abre Alas, A Gentil Carioca – Rio de Janeiro, RJ; Ncruzilounge, A Gentil Carioca – Rio de Janeiro, RJ; VERBO, Galeria Vermelho – São Paulo, SP; Desde Rio, Galeria Belleza Y Felicidad – Buenos Aires, Argentina; NANO, Galeria Studio 44 – Estocolmo, Suécia; Ciclope, Centro Cultural Chacao – Caracas, Venezuela; Para Atravessar Contigo o Deserto da Vida C. Galeria RJ. http://www.bobn.ws/pt/cv_bio/

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Edição de vídeo: João Paulo de Oliveira



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