One Flew over the Void (Bala Perdida) (2005) – Javier Téllez

One Flew over the Void (Bala Perdida) (2005) – Javier Téllez

Morar nos Estados Unidos é um sonho compartilhado por milhares de pessoas. A dominação norte-americana nos comerciais e produtos culturais em geral nos faz pensar que “vencer na vida” só é possível daquele lado. É necessário estar lá para ser alguém, conseguir dinheiro e uma vida digna. Muitos imigrantes vão atrás desse sonho criado. Pessoas sem muito a perder em seus países de nascença seguem em romaria em busca de uma chance. Porém, migrar não é uma experiência fácil. A cada ano que passa, parece que a quantidade de documentação e informação aumenta, o sonho se torna mais distante e, assim, novas estratégias são traçadas.

Com o aumento do muro que divide os EUA do resto da América, o american dream parece ser possível só para alguns. Qual seria a solução? Arriscar a vida, não pensar em mais nada, apenas enfrentar as águas profundas ou o deserto aberto, parece ser a alternativa. Poucos meses atrás uma notícia circulou pela grande mídia brasileira. Uma mulher com seus cinquenta e poucos anos morreu na travessia para os EUA. Ela era costureira no Brasil, tinha filhos e netos, mas achava que a vida seria melhor lá, do outro lado. Com um grupo de amigos se sujeitou a enfrentar o deserto sem nenhuma noção de como seria, apenas acreditou no que os filmes e comerciais vendem: yes, we can. Infelizmente seu destino não foi às ruas de Manhattan ou conhecer o Mickey em Orlando. Ela foi abandonada pelo coiote e pelo grupo que a acompanhava pois estava cansada, precisava descansar. Prometeram buscá-la, promessa feita por palavras vazias. Ela esperou, esperou no sol forte, esperou sem água, esperou sem comida até que seu corpo não aguentou mais a espera e cessou.

Essa senhora, mãe, avó, irmã, é apenas uma dentre vários estrangeiros que não chegam até o destino. Muitas histórias são levadas junto com a areia do deserto pelo vento, ou pelas ondas do mar em pequenos botes infláveis. A pergunta que fica é: vale a pena?

Pensando nos fluxos e restrições migratórias, o artista venezuelano Javier Téllez encena uma possível alternativa para adentrar aos EUA: um homem bala. Relembrando uma prática circense de meados do século XX, o homem bala, Téllez cria um evento, convida o público para assistir ao lançamento, assim como no circo, queremos ver qual distância o homem irá alcançar. A performance acontece na praia, na divisa entre Tijuana e San Diego, se o lançamento funcionar, o homem bala alcançará o sonho de milhares de imigrantes. Antes do lançamento, ele mostra seu passaporte e logo chega em seu destino.

O nome em parênteses da obra, bala perdida, nos faz pensar sobre os milhares de imigrantes que perdem sua identidade ao chegar nos EUA. O lugar de onde vem não importa. Honduras, Guatemala ou México, tanto faz, são todos latinos, perdidos na imensidão de um sonho vendido através de seriados e comerciais de margarina. 

Colírio por Julia Baker



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